50 anos do Grupo Corpo: a dança brasileira que nasceu em casa e conquistou o mundo chega a Uberlândia

Grupo Corpo em 'Piracema' Jomar Bragança/Grupo Corpo/Divulgação Rodrigo Pederneiras. Mineiro, coreógrafo, 70 anos e 50 deles dedicados à dança, especifica...

50 anos do Grupo Corpo: a dança brasileira que nasceu em casa e conquistou o mundo chega a Uberlândia
50 anos do Grupo Corpo: a dança brasileira que nasceu em casa e conquistou o mundo chega a Uberlândia (Foto: Reprodução)

Grupo Corpo em 'Piracema' Jomar Bragança/Grupo Corpo/Divulgação Rodrigo Pederneiras. Mineiro, coreógrafo, 70 anos e 50 deles dedicados à dança, especificamente a um das mais emblemáticas companhias do Brasil, o Grupo Corpo. Ao celebrar meio século do início das atividades em Belo Horizonte, o coreógrafo e um dos fundadores do grupo, concedeu uma entrevista ao g1 sobre essa trajetória disruptiva na dança brasileira. O Grupo Corpo se apresenta em Uberlândia encerrando a temporada 2025 do projeto Uberlândia na Rota das Culturas na quarta (29) e quinta-feira (30), às 20h, no Teatro Municipal de Uberlândia. "A grande contribuição do Grupo Corpo para a dança foi começar buscar uma forma brasileira de ser, de se mover, de dançar, de caminhar. Começamos a cavar no nosso próprio quintal ao invés de buscar coisa lá fora e quanto mais a gente cavava mais maravilhas e tesouros a gente encontrava", disse Rodrigo. Ele conta que quando começou a coreografar e essas coreografias começaram a ser vistas, o público adorou, mas o meio da dança não aceitou bem. "Para eles era como se estivéssemos fazendo algo pejorativo. 'Como assim, vocês vão dançar rebolando'? Eu só podia responder 'usando a bacia'", ironiza. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Triângulo no WhatsApp Mas foi exatamente aí que o Corpo encontrou o seu nicho e que veio a se transformar em referência brasileira. Rodrigo conta que enquanto outros espetáculos queriam saber o que se estava fazendo na Europa, Estados Unidos ou Canadá, o Corpo voltou os olhos para o que queria ser. "Se falava muito em dança brasileira, mas na verdade, escolhiam um tema ou um personagem brasileiro e replicavam o que era feito lá fora. Nós crescemos criando essa linguagem cantada, voltando os olhares pra nós mesmos". Uma escola para chamar de lar Em 1976 a casa de Isabel Pederneiras Barbosa e Manoel de Carvalho Barbosa era uma das mais movimentadas no bairro Serra, em Belo Horizonte. Os cinco filhos, quatro homens e duas mulheres, jovens inquietos apaixonados por dança, inventaram de montar um grupo. "É uma história única. De nós todos só o Paulo, arquiteto, não veio pra dança, mas namorava uma bailarina. Pedro era engenheiro e o José Luiz, médico e nenhum seguiu a profissão, meu pai quase morreu", brinca Rodrigo. Apesar de sério e talvez um pouquinho decepcionado, Manoel percebeu o quanto os filhos e filhas estavam envolvidos com essa história de criar uma companhia. "A gente queria mesmo começar uma escola mas não tínhamos dinheiro. Foi quando eles fizeram a ação mais gentil que já vi em toda minha vida. Nos deram a única casa que tinham para montar a escola e alugaram um apartamento", recorda o filho até hoje muito grato. A casa onde ficaram até 1978 foi a primeira sede do corpo, foi o alicerce que permitiu o grupo a chegar onde está, foi lá que apresentaram a primeira coreografia de Oscar Araiz, "Maria Maria" (1976) com música de Milton Nascimento e roteiro de Fernando Brant. Os pais não gostavam muito que os filhos fossem pra rua, mas podiam levar todo mundo pra casa deles. "Meus pais foram as pessoas mais generosas que conheci. Nossa mesa sempre tinha 12, 15 pessoas que nem eram da família. Era mesa posta o dia todo. Infelizmente essa casa atualmente é um estacionamento de supermercado. Não se guarda muita história nesse país". O grupo cresceu, foi para uma sede de três andares onde além dos ensaios tinham também atividades pedagógicas. O interesse pelo grupo crescia a cada ano. Nadando contra a maré O Corpo nunca foi de seguir tendências. Comemorando 50 anos em 2025, o grupo mineiro de dança tinha que fazer algo no mínimo, inédito. "Piracema" é o espetáculo que está rodando o Brasil na turnê comemorativa e Uberlândia é a única cidade no interior do país a receber o espetáculo. "A gente faz capitais e Uberlândia", brinca Rodrigo Pederneiras. Para ele, a cidade é ponto de parada obrigatório. "Tem um teatro incrível e o público sempre nos recebe tão bem". E dessa vez não deve ser diferente. Desde que estreou, Rodrigo afirma que 'Piracema' conta com teatros lotados e é aplaudido de pé pelos espectadores. É uma experiência inédita do grupo. Da luta dos peixes que nadam contra a correnteza para sobreviver, veio a inspiração para a trilha de Clarice Assad. "A proposta foi para dificultar a nossa vida. Um processo que nunca vi dessa maneira. A Clarice entregou a trilha de Piracema para que eu fizesse toda a coreografia com 11 dos 22 bailarinos. Os outros 11 ficaram com a Cássia Abranches. Quando juntamos as duas coreografias foi emocionante. Em alguns momentos, o trabalho de um completava o do outro e isso foi impressionante", conta Rodrigo. Foi também um exercício de desapego quando as coreografias não ornaram. "Quando não dava certo a gente ficava chateado, mas é importante entender quando um trecho não cabe na obra. Foi um jeito muito maluco de compor esse espetáculo e se for pensar, agora temos três: a minha versão, a da Cássia e essa que está em turnê". Além de 'Piracema', o público vai assistir também a 'Parabelo', (1997), com música de Tom Zé e José Miguel Wisnik, um retrato em som, cor e movimento da vida sertaneja brasileira. O cinquentenário do Corpo também vai ganhar um documentário, sobre o qual Rodrigo não deu maiores detalhes. "Sem spoilers", brincou. A culpa é da irmã! A história do Grupo Corpo é recheada de acasos. Ou seriam caprichos do destino? No início dos anos 1990, Malu Figueiroa tinha 6 anos de idade. A irmã mais velha, Ana Flávia, tinha uma pisada torta e para corrigir, o ortopedista recomendou aulas de balé. Na logística da família, ajudaria colocar as duas filhas nas mesmas atividades extra classe. Então, Manu, a tiracolo, acabou numa escola de dança. A rotina não era fácil, principalmente porque a primeira professora era muito exigente, ou, ao olhar das irmãs, "brava". Ana Flávia não durou muito na escola, já Malu encontrou ali uma paixão, mesmo em meio a tanta loucura. Aos 41 anos, Manu é a integrante com mais tempo no Corpo. A irmã virou engenheira elétrica. Assim como a história do Corpo, a história de sucesso de Malu começou graças ao incentivo e apoio da família, que não mediu esforços para proporcionar a ela a estrutura que precisava para dar os primeiros passos. "Quando eu olho para aquele começo, lembro do esforço dos meus pais para me levar às aulas, aos ensaios, apresentações, cuidar da agenda da minha irmã e de tudo que envolve o dia a dia de uma casa. Minha mãe voltou a estudar mais velha. Ela entrou na PUC pra fazer geografia a noite e saía no intervalo para me buscar e eu ficava com ela, na sala, até o final da aula. A gente achou um jeito de fazer dar certo". Na capital mineira, Malu, já entrando na adolescência, foi estudar no Centro de Formação Artística e Tecnológica (Cefart), no Palácio das Artes, e depois foi para o grupo Camaleão. A dedicação e o talento a levaram para o Balé Teatro Castro Alves (BTCA), na Bahia. De volta a Minas, passou a integrar o Balé Jovem companhia profissional de dança contemporânea. Foi onde teve o primeiro contato com Cássia Abranches. "Ela era bailarina do Corpo e fez sua primeira coreografia no Balé Jovem. Eu já tinha 17 anos de atuação profissional na dança mas ainda não me julgava à altura do Grupo Corpo", disse Malu. "Eu achava que o Corpo era muito distante pra mim, que eu não tinha a excelência deles, achava difícil e a linguagem da companhia é muito específica, você não tem aula de Rodrigo Pederneiras nos lugares, eu achei que nunca alcançaria esse lugar". Ela estava errada. E foi aos 26 anos, quando soube que haveria uma audição, que ela entendeu que queria estar naquele lugar. E as audições para o Corpo eram raras, porque a maior parte dos bailarinos tem uma carreira longeva na companhia. "Já era hora de algo dar muito certo na minha vida. A audição ainda era num formato pouco comum hoje, aberta, com duas etapas. Foram mais de 100 candidatas para selecionarem seis e eu estava entre elas". Para Malu, o processo de seleção foi uma virada de chave e desde 2010, quando entrou, ela ainda se sente orgulhosa toda vez que olha para o lado. "Foi um misto de ansiedade e dúvidas se conseguiria me adaptar, mas esse respeito aos bailarinos que já estavam lá antes de mim, a acolhida que tive deles e o incentivo diário fizeram toda a diferença. Eu era muito séria, fechada, até rígida às vezes, e eles me ensinaram a melhorar, é assim, é uma troca o tempo todo". Essa marca dos 50 anos, pós pandemia, é muito emblemática para Malu. "Eu me sinto honrada por fazer parte dessa história, eu cheguei, eu estou aqui e continuo me empenhando, cuidando para estar sempre saudável porque não tem como performar bem de outra forma, quero merecer esse espaço que conquistei". Malu sente que o tempo passa rápido, mas segue feliz em viagens pelo mundo e no aprimoramento diário que tem no Corpo, sua melhor escola. Todas as noites antes de subir ao palco ele coloca as mãos no chão para se conectar com a energia do lugar. "É isso que farei em Uberlândia, novamente, vou sentir toda a energia do Teatro Municipal e me conectar com cada um que saiu de casa para nos assistir". Caçula do grupo estudou no Bolshoi do Brasil Giulia Madureira tem 24 anos, entrou em novembro de 2022 no Grupo Corpo, já com uma trajetória de respeito. acabado de fazer 22 anos. Uma sergipana que começou a dançar muito cedo e saiu de casa com 12 anos após ser selecionada pela Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, em Joinville (SC). "Mobilizei a família e o estado todo para seguir esse sonho", conta a jovem. Giulia se formou no Bolshoi durante a pandemia e foi para a Curitiba Cia de Dança. Mas antes, nos anos avançados no Bolshoi, ela já procurava outras escolas. "A gente pesquisa outras companhias, pra ver pra onde poderíamos ir. Eu vi o Corpo pela primeira vez pelo YouTube. O espetáculo era 'Gira' e aquilo me impactou tanto, fiquei maravilhada. Pensei: 'o que preciso fazer para estar lá'"? A bailarina poderia escolher outras escolas, até em outros países, mas escolheu o Corpo. Aprovada na seleção, passou à rotina intensiva de treinos, ensaios, de segunda a sexta-feira, sempre com algo novo para aprender. "Eu vi ali a possibilidade de crescimento com desafios diários e é isso que vivo todos os dias ensaiando os balés que temos, o que está por vir e estou realizando um sonho. Eu dizia pra minha mãe desde muito pequena que queria conhecer o mundo dançando, só não imaginava que faria isso em uma companhia brasileira. Foi o combo perfeito: trabalhar no meu país e conhecer o mundo com pessoas incríveis que dividem o palco comigo". Desde sua estreia no Corpo, Giulia já se apresentou com o grupo na Alemanha, França, Estados Unidos, mas vai estrear em Uberlândia. "Por mais que a gente se prepare, tem sim, um pouco de nervoso. Eu tento me descontrair escrevendo pra mim mesma, pra entender como me sinto, e ouvindo música, de MPB a Hip Hop, algo que foge completamente do que costumo dançar". LEIA TAMBÉM: Ousadia e paixão pela TV: presidente do Grupo Integração, Tubal de Siqueira Silva comemora 88 anos Bailarino de Uberlândia é premiado em competição internacional na Suíça 📅 "Piracema" - Grupo Corpo em Uberlândia Data: 29 e 30 de outubro Horário: 20h Local: Teatro Municipal de Uberlândia (Avenida Rondon Pacheco, 7.070, Tibery) Ingressos: de R$ 39 a R$ 140 pelo Mega Bilheteria Classificação: livre Grupo Corpo celebra 50 anos em Piracema José Luiz Pederneiras/Divulgação Assista também: Bailarino de Uberlândia vai para a Suíça Bailarino de Uberlândia vai para a Suíça VÍDEOS: veja tudo sobre o Triângulo, Alto Paranaíba e Noroeste de Minas

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